06 janeiro 2008

Estragar a nossa africanidade

Irmãos
Aqui me têm novamente para participar convosco neste fórum.
Estou inteiramente de acordo com a autora angolana Koluki.
Efectivamente, o passado das sociedades africanas está repleto de uma organização harmoniosa, na qual a democracia colegial, participativa e transversal era uma constante.
Ninguém melhor do que o nosso insigne e infelizmente já falecido historiador Joseph Ki-Zerbo mostrou como nós éramos e vivíamos. Muito do que fomos foi produto de opções africanas genuínas e uma dessas opções, sem dúvida gradiosa, foi as das relações inter-pessoais contra o maquinismo típico e doentio dos europeus.
O problema, porém, começou com a colonização em todas as suas bárbaras manifestações, desde a desorganizações das nossas redes democráticas inter-pessoais até à odiosa escravatura.
Quando as independências começaram a chegar, os nossos primeiros dirigentes, vividos e formados na Europa, eram portadores do gérmen dos valores que aprenderam. Quiseram montar a casa da Europa aqui, na nossa casa, nos nossos costumes, nas nossas regras. Nem mesmo tentando o disfarce da negritude conseguiram ser mais do que foram: marionetas do Ocidente. Os ditos vanguardistas, os Nkrumahs, os Cabrais, os Netos, os Samoras, etc., todo eles quiseram introduzir práticas e maneiras de pensar completamente estrangeiras aos nossos costumes e à nossa cultura. Leiam, por exemplo, o "Conscientismo" de Nkrumah. O que é isso senão a desastrada tentativa de pensar o nosso continente e de lhe quer impor o materialismo dialéctico dos comunistas?
Depois, a Europa impôs-nos o multipartidarismo. E com o multipartidarismo começaram outros problemas, muito sérios problemas.
Um desses problemas é a aplicação mecânica do modelo urbano-ocidental nas nossas sociedades, transformando em voto-homem o que era, antigamente, a voz-sociedade, a voz clânica, a voz camponesa.
Um outro grande problema é o enorme gasto de dinheiro que se faz para montar os recenseamentos e depois o processo eleitoral, quando os nossos camponeses sofrem e apenas querem água, energia, lojas, barragens, etc. E periodicamente temos o país cheio de políticos a gritar promessas, a gastar dinheiro em propaganda e coisas assim sem fim.
Isso não é democracia: isso é o corpo da Europa cansada sentado em cima da nossa alma africana. Isso é estragar a nossa africanidade, ofendê-la.
Permito-me ficar por aqui hoje.
E mais não disse.
Os meus cumprimentos.

Félix Gorane

15 Comments:

Blogger Koluki said...

Caro Felix Gorane,

Muito obrigada pela atencao dedicada ao meu texto.
De facto temos - Angolanos, Mocambicanos e Africanos em geral - muito que repensar no sentido de construirmos um futuro melhor para o nosso continente, respeitando contudo o passado em todas as suas vertentes.
Permita-me sugerir que o grande desafio que temos pela frente e' como encontrarmos um equilibrio entre aquilo que, voluntariamente ou sob varias formas de imposicao, nos vimos ao longo da Historia obrigados a adoptar e o que resta da nossa "africanidade estragada".

Um grande kandandu e
Kanimambo!

domingo, janeiro 06, 2008 8:16:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Kandungu, minha Senhora.
Félix

segunda-feira, janeiro 07, 2008 12:34:00 da tarde  
Blogger AGRY said...

O regresso às origens!
Em determinadas latitudes, de quando em vez, surgem vozes que exaltam o regresso ao passado. Sim, ao passado précolonial. São os reconstituidores da história da humanidade e de África em particular.
São os investigadores da última geração, de topo de gama. São os iluminados do século XXI!
Para estes, queria recordar um episódio narrado por Basil Davidson:
“Há cerca de um oito décadas, numa clareira da floresta congolesa, um belga estava sentado no chão a tomar notas. Este belga, cujo nome era Emil Torday, considerando o tempo e o lugar, era um homem de tipo pouco usual, um tipo estranho de europeu, pois o que ele buscava ali não era nem borracha, nem marfim, nem trabalho escravo; o que ele procurava era informações acerca do passado “
B. Davidson é um estudioso de África. Escreveu sobre África e os africanos, ao sul do Sara, incidindo sobre os mil e quinhentos anos anteriores ao inicio da época colonial. Apresentou em esboço o que hoje se conhece, e o que hoje parece razoável acreditar, acerca de certos aspectos da vida e da civilização africana durante esse período, contribuindo assim para uma melhor compreensão das origens e das raízes da África de hoje.
Esta breve introdução, surge a propósito das posições de alguns cidadãos que se refugiam num passado que mal conhecem, para fundamentar a sua alergia a concepções politicas que lhes provocam um permanente mal-estar.
Compreendo, embora não concorde, o conservandorismo que muitos manifestam desde as independências. Compreendo , mas não concordo, que nunca tenham erguido a voz ante a presença do opressor. Compreendo, mas não concordo, que questionem o talento de intelectuais e revolucionários africanos como Nkrumah, Mandela ou Amilcar Cabral.
Se calhar não compreendo porque nenhum cientista em África, digno desse nome, teve a ousadia de apelar para a rejeição das ciências biomédicas e regressar exclusiva e definitivamente aos velhos métodos da terapia africana. O mesmo se passa noutras ciências e noutras áreas.
Passa pela cabeça de alguém entregar o ensino, a divulgação, a aplicação e a gestão do Direito a chefes tradicionais? Poderia desfilar um infindável cortejo de exemplos.
Porquê, então acossar a politica? Porque fazer dela uma excepção e um convite permanente para a sua reinvenção em termos africanos?
Os maus politicos, os déspotas e os corruptos, são a armadilha, o pretexto, para justificar um apelo a um nacionalismo exacerbado?
Não resisto a citar Clemente Zamora:
“Enquanto Roma e os povos latinos exerciam a hegemonia no mundo, os anglos e os saxões eram povos primitivos e bárbaros. Uns séculos mais tarde, Roma desaba, e os povos germânicos assumem a direcção mundial. Os povos, contudo, não tinham mudado: os romanos continuavam sendo latinos e os bárbaros continuavam sendo germanos”
A reinvenção da linguagem – democracia africana, democracia árabe – é uma derradeira tentativa de enganar os menos informados e protelar, ainda mais, o despertar de uma verdadeira consciência que reclame que não há verdadeira democracia sem progresso social.
Talvez fosse preferível esquecer o termo "democracia" e falar bastante mais de "democratização", entendida como um processo sem fim” diz-nos Samir Amin
Por seu turno, os contorcionismos da burguesia, de todos os continentes, têm como suporte o carácter desinformativo e anestesiante da propaganda ao seu serviço.
Termino com Marta Harnecker, “devemos procurar mostrar que a politica não é arte do possível, mas a arte de construir a força social e politica capaz de mudar a realidade, tornando possível, no futuro, o que hoje nos parece impossível”

segunda-feira, janeiro 07, 2008 12:42:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Caros bloguistas,
admiro todas as tentativas de fazer prevalecer de forma pacifica os seus ideias, desde que sejam inicitivas licitas e de boa fe.
Compreendo a necessidade que se impoem a alguns contemporaneos das sociedades africanas de tentarem resgatar as pseudo gloriosas sociedades pre colonias como a prova de que o mal foi trazido de fora, porque os maus sao os outros e nos sempre fomos bonzinhos.

Nao tenho qualquer duvida sobre a razia socio cultural que foi engedrada pelos colonizadores.

Mas a questao que coloco e, teremos hoje condicoes objectivas para reviver estas nocoes de democracia que os nossos ancestrais viveram?

Usando um proverbio popular diria que, o caldo esta entornado,nao ha nada a fazer.

E hora de nos situarmos No conteXto actual e maximizarmos as nossas vantagem comparativas em termos culturais, mas sempre associada as tendencias universais de governacao e desenvolvimento, ao inves de querermos desculparmo-nos e destruir as intituicoes que sao universais, tal como o direito a vida, direito a seguranca alimentar , etc...

O nosso desenvolvimento teve uma interrupcao historica, sem precedentes na historia da humandiade, mas significara isso, que no estagio actual nao teremos forcas para reinventar a nossa sociedade ao inves de emprestar do passado " democracias" tipicamente aficanas??

Sao duvidas

Muzimene

segunda-feira, janeiro 07, 2008 3:12:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Mes amigos, estou quase à terminer uma carta de resposta.
Amicalement.
Joseph Poisson

segunda-feira, janeiro 07, 2008 5:25:00 da tarde  
Blogger Patricio Langa said...

Caro Agry.
Acho a sua abordagem interessante. Os mitos de origem criam sempre a ilusão da perfeição desse passado mítico. Antes dos colonialismos Africa era um paraíso na Terra. Fala-se se isso como se o conflito, o mesmo o consenso, intrínseco em tudo que é relação social (de poder) não existisse nessas sociedades. Tudo era perfeita harmonia. Enfim, o seu texto está repleto de exemplos que demonstram quão problemático é este tipo de raciocínio.
Parabéns.

segunda-feira, janeiro 07, 2008 6:21:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Agry,
A sua última citação diz tudo.
Bravo!

segunda-feira, janeiro 07, 2008 6:36:00 da tarde  
Blogger Koluki said...

Bom, caros senhores, eu teria imenso prazer em debater ideias com alguns de vos, mas certamente nao insultos nem ataques pessoais - particularmente quando nao se conhece a pessoa a quem se ataca e ate' que ponto ela sabe, ou nao, do que esta' a falar...
Nao vou portanto pelo caminho que aqui pretendem impor - e falo apenas por mim, embora pela forma como as questoes foram aqui colocadas, eu acabei por ser "embarcada" no mesmo barco do amigo Felix Gorane; do que nao me queixo, apenas nao pretendo falar por ele...
Mas ainda sou capaz de me dispor a regressar a este tema se porventura algum dos senhores que aqui apareceram com ataques tao viscerais se dispusessem:

i) A "falsificar" com factos (nao com o que, perdoem-me mas nao posso deixar de considerar pouco mais do que 'verborreia ideologica') aquilo que expus no meu texto;

ii) A "explicar" (nao pediria tanto como um "modelo explicativo"...) de onde lhes vem tanta aversao a ideia de uma Africa algo diferente da que teem nas vossas cabecas, ou nos vossos "laboratorios farmaceuticos";

iii) Em que linha, frase, ou paragrafo do meu texto eu sugeri um "regresso a uma Africa idealizada e/ou isolada do resto do mundo".

E' tudo de minha parte e continuo agradecida pela atencao, embora certamente nao pelos insultos.

segunda-feira, janeiro 07, 2008 11:06:00 da tarde  
Blogger AGRY said...

Minha cara senhora
O Espírito do deixa-falar é um blog que provoca debates com agenda prévia e com as personalidades “residentes”.
Depois, surgem os intrometidos como eu e a senhora.
Basicamente, nós, os outros, assistimos ao debate da plateia e, de quando em vez, poderemos dar umas dicas de apoio (ou crítica) aos principais intervenientes. Mas insisto: o núcleo duro e estruturador do debate está claramente definido.
Apesar de não me sentir beliscado com as suas palavras, este brevíssimo comentário resulta da sua evocação de insultos. Questiono-me: teria eu, de algum modo, sido deselegante para quem não estava na mira do meu comentário?
Agry

terça-feira, janeiro 08, 2008 1:22:00 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Amiga Koluki
Há anos que debatemos, começámos primeiro nos jornais...Parecemos muito cáusticos, mas somos profundamente amigos e amigos de quem participa, pode crer. E o Agry tem o mesmo espírito.
Continue connosco, beijinho.
Sónia Ribeiro

terça-feira, janeiro 08, 2008 12:52:00 da tarde  
Blogger Koluki said...

Querida Sonia,

Ha' anos que tambem debato em varios espacos, incluindo em jornais.
E foi de espirito aberto e constructivo que pedi a vossa indulgencia pela minha intromissao, apresentando aqui extractos de um texto escrito e publicado ha' catorze anos e que, portanto e por isso mesmo, nao teve em mente nenhum dos intervenientes neste debate, ou os seus particulares pontos de vista.
Apenas me pareceu que os extractos que aqui postei iam de encontro as suas questoes sobre a 'democracia africana'.
Tive inicialmente algum pudor em faze-lo uma vez que as questoes nao me eram dirigidas, mas em face da sua amigavel resposta e da concordancia de Gorane, senti-me menos constrangida.
Venho-me habituando (nao sem enormes custos pessoais, devo dize-lo) a uma onda de ataques pessoais de toda a ordem por parte de individuos em certos sectores da blogosfera que parecem ter decidido cerrar fileiras para me "abater" a qualquer custo, sem contudo terem a coragem de o fazer no meu blog ou demonstrar de forma clara e aberta de onde lhes vem tanta bilis contra a minha pessoa e o meu blog - certamente nao o podem fazer porque alguns deles agem sob anonimato, mesmo quando se associam a um 'nome' ou 'imagem' - enquanto eu nunca escondi o meu verdadeiro nome, ou a minha cara, muito menos as minhas ideias...
Tudo isto para lhe dizer que a minha reaccao foi ao comentario do senhor farmaceutico de Paris, que menciona o meu nome - a mais ninguem!

Outro beijinho.

terça-feira, janeiro 08, 2008 9:36:00 da tarde  
Blogger AGRY said...

Felicito-a/nos pelo seu regresso.
Cumprimentos

terça-feira, janeiro 08, 2008 10:21:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Dona Koluki
Não se esconde sob o anonimato?
E os comentários insultuosos e racistas que (não tão anonimamente como acha) gosta de deixar nalguns blogs?
Deixe-se de tretas. Assuma-se como brilhante intelectual que diz ser e deixe-se de racismos bacocos.

domingo, janeiro 27, 2008 9:48:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Olá, depois de me assumir como 'anónomo assumido' aqui estou a mostrar a minha verdadeira face: malonguito. E a reiterar o que disse anteriormente. Essa senhora Koluki insultou-me gravemente no meu próprio blog, apenas porque sou branca.
Por dtrás dessa capa de intelectual esconde-se uma complexada retrógrada que quer sim um regresso ás origens.

segunda-feira, janeiro 28, 2008 12:18:00 da manhã  
Blogger Koluki said...

Ha' muito que nao dava uma espreitadela por aqui. Mas eis que hoje encontro os ultimos dois comentarios.
Nao sei em que medida os autores e leitores deste blog terao acompanhado o meu blog praticamente desde o inicio. Mas aos que nao o fizeram recomendaria que dessem uma vista de olhos aos comentarios a dois posts, cujos links aqui deixo a vossa disposicao.
Tendo em mente que o blog que eu fiz o Blogger encerrar por pratica do mais abjecto racismo, da mais nojenta pornografia, da mais irracional fixacao na minha pessoa e nos meus escritos, irreparaveis injurias morais politicas e psicologicas a mim e a minha familia, com violacao dos meus direitos de autora e dos da Uniao dos Escritores Angolanos pelo meio, era da autoria da criatura que aqui deixou cobardemente esses comentarios...
Uma vez que eles constituem nada mais do que difamacao, e uma vez que comeco a realizar que a arma predileta dos racistas de extrema direita que me teem perseguido desde que criei o meu blog e' precisamente a difamacao, por falta de qualquer outra, gostaria de sugerir aos controladores do blog que retirassem esses dois comentarios.
Poderao tambem retirar este meu comentario, depois de o fazerem.
Muito obrigada.

http://koluki.blogspot.com/2007/09/victoria.html

http://koluki.blogspot.com/2007/09/marcelo-caetano-rebelo-de-sousa.html

sábado, fevereiro 16, 2008 10:54:00 da tarde  

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