03 janeiro 2008
Li atentamente o texto do Sr. Geraldo e devo confessar que concordo no geral com ele.
Porém, ele peca por um erro clássico neste tipo de análises, que é o de considerar as ditas "realezas" como algo monolítico, como algo igual em toda a parte, como algo errado afinal.
Por outras palavras: o problema capital do texto do Sr. Geraldo consiste em ter evitado dizer que nós, Africanos, tínhamos e temos uma concepção e uma prática de democracia, variada é certo ao longo dos séculos, mas tínhamos e temos.
O nosso problema, o problema dos Africanos, foi sempre duplo: primeiro termos aprendido a gostar da colonização em geral, ficou-nos sempre o gosto de macacos de imitação; segundo, termos aprendido, como uma das consequências, a desprezar as nossas próprias tradições, a nossa própria maneira de ser. Temos vergonha e, até, medo, em dizer não aos europeus e em impormos as nossas formas de fazer democracia.
Irmãos: os regulados, as chefias que dizemos tradicionais, são, hoje, uma degeneração lastimável, produto da colonização. Reparem como os Estados usam e abusam dessas caricaturas da democracia.
As nossas tradições orais contam-nos que, nos tempos, todos nós tínhamos uma palavra a dizer nos nossos concílios africanos, os nossos chefes antigos não eram nem imperadores nem chefes no sentido europeu, não eram jamais Napoleões nem Luíses XIV, mas gestores da res publica. Homens, mulheres, crianças, todos participavam nessa res publica, todos tinham uma contribuição a dar, a partilhar, a levar avante.
O colonialismo primeiro, o imperialismo de hoje a seguir, fizeram primeiro degenerar as nossas instituições costumeiras e, depois, impuseram-nos regras "democráticas" completamente estrangeiras à maneira africana de gerir o nosso destino.
Irmãos: diz um nosso provérbio do Rwanda, que a água quente jamais esquece que já foi fria.
Se não sabemos para onde vamos, saibamos ao menos de onde viemos.
Por agora faço como Sr. Geraldo: deixo ficar aqui algumas ideias gerais.
Os meus cumprimentos.
Félix Gorane
(Sr. Carlos: escrevi o texto rapidamente e não tive tempo de o rever. Corrija por favor os erros que houver. Muito agradecido.)
2 Comments:
Sim, acabei de corrigir um pequenino erro. Abraço.
Talvez fosse interessante introduzir para o debate Kwame Nkrumah.
Segundo ele, durante a época colonial, apareceu, pretendendo servir de elo de ligação entre o poder colonial e as massas, uma “intelligentsia” de formação ideológica ocidental.
Mesmo que envolvida em movimentos nacionalistas, o seu objectivo nunca apontou para transformações radicais. A sua intenção não foi, nunca foi, mudar o “sistema”, mas controlá-lo.
Depois da independência, a intelligentsia perdeu o unanimismo. Podiam, então, distingui-se três grupos bem demarcados:
Em primeiro lugar, os aliados da nova classe privilegiada local, isto é, a burguesia burocrática, politica e comercial, abertamente aliada do imperialismo e do neocolonialismo.
Seguia-se, então o grupo dos partidários de um desenvolvimento “não capitalista” e de uma “economia mista”.
Para terminar, os intelectuais revolucionários, constituem o terceiro grupo que apareceu no seio da intelligentsia.
Enfim, tudo isto na perspectiva de que não pode haver democracia autêntica sem progresso social
Armando
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